Haroldo Lima: “Poderá voltar, fortalecida”
A diferença de votos no Senado, entre os que eram a favor e os que
eram contra a admissibilidade do impeachment da presidenta Dilma, foi
grande – 55 a 22. Entretanto, golpistas ficaram intranqüilos e cresceu o
ânimo dos que lutam contra o impeachment sem crime. As razões são as
seguintes.
1) O julgamento desse impeachment começará agora, após a
admissibilidade aprovada na madrugada de 12 de maio. Poderá se estender
por seis meses no próprio Senado, sob a direção do presidente do Supremo
Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski. Buscará provas das acusações
feitas à Dilma. Documentos serão examinados, oitivas serão feitas, de
autoridades, técnicos e testemunhas. Pelo que se viu até agora, essas
provas não aparecerão, pois “crimes de responsabilidade” não ocorreram.
Ficará mais desmascarado ainda o contorcionismo do Relatório Anastasia
que, ao invés de procurar o “criminoso” a partir de “crimes”
descobertos, saiu atrás de “crimes”, a partir do “criminoso” escolhido
para ser condenado.
2)Durante os prováveis seis meses do julgamento, Temer procurará
governar, com seu governo de 23 ministros, sem uma mulher e sem um
negro. Com essa lástima de governo que, nem de longe tem a cara do
Brasil, enfrentará muitas dificuldades. Não só pela estranha fisionomia
machista e branca que exibe, como porque nosso povo não tem o costume
de se submeter a governo ilegítimo, ainda mais com traidores e
corruptos. Os problemas do país, frutos da situação internacional, das
sabotagens recentes da oposição e das debilidades e erros do próprio
governo Dilma, não são passíveis de serem resolvidos por um governo
improvisado, desconectado da realidade, sem voto e sem prestígio. O
governo Temer procurará por em prática algumas das idéias do seu
programa “Uma ponte para o futuro”, já conhecido como “um túnel para o
passado”, pela sua linha condutora neo-liberal. Isto despertará a
rejeição da população, que verá ameaçados direitos e garantias, apesar
das juras em contrário. O novo governo poderá tentar acabar com a
partilha no pré-sal e privatizar setores importantes da economia, o que
atingirá em cheio o sentimento nacional. A idéia da eleição direta para
resolver a crise, após o fim do golpe do impeachment, ganhará as ruas e
poderá requerer a convocação de um plebiscito.
3) A nova oposição, que seremos nós, mostrará à população a
fisionomia de um setor patriótico, democrático, combativo, responsável,
defensor da nacionalidade e dos interesses populares. Procurará
identificar as debilidades e os erros que cometemos e, com sinceridade,
mostrará a disposição de corrigi-los quando outra oportunidade tivermos.
Não aceitará a politização de setores judiciários e policiais, como os
da Operação Lava Jato, que combatem uns corruptos para proteger outros,
porque não transigiremos com a corrupção, venha de onde vier.
4)Há outro fator positivo que pode evoluir. É que a presidenta Dilma,
nesse processo de impeachment, foi de uma dignidade a toda a prova.
Demonstrou firmeza e coragem. Ao deixar o Planalto, dirigiu-se à Nação,
de cabeça erguida, serena, reafirmando princípios, proclamando inocência
e postura de resistência. Quando à frente do governo, trouxe para a
política uma quantidade de mulheres em número nunca visto no país, o que
contrasta agudamente com o banimento completo das mulheres do governo
Temer. A pobreza, as mulheres e a juventude entenderão, gradativamente, o
que se passa no país, contra quem o golpe parlamentar se volta. A
popularidade da Dilma poderá crescer.
5) Nova votação no Senado coroará esse impeachment. Em causa estará o
afastamento definitivo de Dilma Rousseff da presidência do país ou o
arquivamento do impeachment. Para que o afastamento ocorra, serão
necessários 54 votos, 2/3 dos 81 senadores. Na votação da
admissibilidade, os que defendem o impeachment tiveram 55 votos. Não
precisavam de tantos, 41 seriam suficientes. Mas, para votar o
impedimento definitivo da presidenta, precisarão de 54 votos. Ocorre,
que tiveram apenas um a mais do que esse mínimo. O clima polarizado da
votação levou a três tipos de discursos: 1) daqueles que votaram
firmemente contra o impeachment; 2)dos que firmemente votaram a favor do
impeachment; e 3) dos que votaram para que se abrisse o processo de
julgamento do impeachment, mas que disseram não saber ainda como se
posicionarão ao final.
6) No primeiro grupo, o dos 22 senadores que votaram contra a
admissibilidade do impeachment, nenhum disse estar em dúvida. Todos
votarão, no final, contra o impeachment. Uma parcela majoritária do
segundo grupo, dos que votaram pela admissibilidade do impeachment,
tampouco tem dúvidas. Votará para cassar o mandato da presidenta. Mas, o
terceiro grupo, minoritário dentro do segundo, votou pela continuidade
do impeachment dizendo que o fazia apenas para que o julgamento
começasse, mas que não tinha convicção sobre como votaria no final.
Deste grupo, alguns podem votar contra o impeachment. E aí é que vem a
conclusão desse raciocínio: se apenas dois desses que “estão em dúvida”
mudarem seu voto, ou se abstiverem de votar, o impeachment será
derrotado. Como a situação poderá evoluir favoravelmente aos que são
“contra o golpe”, é grande a probabilidade de, pelo menos dois dos que
“estão em dúvida”, votarem pelo retorno da presidenta.
Entende-se, assim, a fala do senador Marcelo Crivella, um que votou
pela admissibilidade do impeachment dizendo estar “em dúvida” sobre a
votação final. Disse o senador pela TV Senado, logo após a
admissibilidade do impeachment: “A presidente poderá voltar, inclusive
fortalecida”.
Haroldo Lima – é engenheiro, foi deputado federal pela Bahia, e é membro do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil
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