PF liga PSB e PSDB a esquema bilionário de corrupção em Pernambuco
Apenas da Petrobras, investigação identificou R$ 5,7 milhões desviados às empreiteiras contratadas para grandes obras no estado
Postado por Agência PT, em 16 de outubro de 2014 às 13:02:10
Um dos coordenadores da campanha do
tucano Aécio Neves no estado de Pernambuco, Geraldo Cisneiros, e o
ex-deputado federal pelo PSDB Bruno Rodrigues, agora no PSB, comandavam
um esquema de corrupção descoberto pela Polícia Federal com ramificações
por diversos órgãos estaduais.
O esquema, segundo a PF, surrupiou
dinheiro da educação (merenda e fardamento escolar), saúde
(terceirização de serviços médicos, Unidades de Pronto Atendimento e
medicamentos), combustíveis, recursos humanos (contratação de
funcionários fantasmas) e empreendimentos no Porto de Suape. Há, também
indícios de fraudes financeiras na Fundação Previdenciária do Estado
(Fundepe), que passa por dificuldades.
Cisneiros e Rodrigues são dois dos
principais protagonistas do inquérito 433/2007 da PF, ora em trâmite no
Fórum de Jaboatão dos Guararapes, região metropolitana de Recife. Foi lá
que tudo começou, com uma investigação sobre exploração do jogo do
bicho pelo doleiro Severino Jordão Emereciano, acusado de manter
ligações com autoridades locais. O doleiro era dirigente do PSDB e
chegou a se candidatar ao cargo de vereador em Jaboatão.
O relatório final da denúncia à Justiça
pernambucana, ao qual a Agência PT de Notícias teve acesso no Fórum de
Jaboatão, não específica o valor total arrecadado pelo esquema, mas a
investigação da PF tem indícios que o montante pode superar R$ 1 bilhão.
De acordo com o inquérito, o esquema foi
muito bem estruturado e manteve-se contínuo, durante anos, a partir de
procedimentos criminais voltados para o repasse de dinheiro aos membros
do grupo. Por essa razão, foi apelidado de “mensalão pernambucano” pelos
policiais federais.
As reuniões do grupo, de acordo com
escutas telefônicas registradas no inquérito, eram feitas na sede da
Ceasa, em Recife. Até hoje, no entanto, nada aconteceu com os
funcionários públicos flagrados em atividades do esquema. As comissões
variavam de 5% a 35% dos valores contratados pelas secretarias
estaduais.
Funcionários fantasmas
– Cisneiros, um dos coordenadores da campanha de Aécio em Jaboatão,
chegou a ser eleito para a Câmara de Vereadores do município. Sua prisão
preventiva foi decretada, mas relaxada quase imediatamente após a
expedição da ordem judicial.
Junto com outro Cisneiros, o colunista
político Magno Martins (casado com a vereadora tucana de Recife, Aline
Mariano, do PSDB) nomeava funcionários fantasmas para ocupar cargos
políticos, em comissão, na Câmara. Um indicava, outro nomeava. O
dinheiro se destinava à campanha política do tucano, conforme o
relatório da PF.
As operações da PF – Jogo do Bicho,
Farda Nova e Zelador – acabaram por expor a intensa atividade de tráfico
de influência, lavagem de dinheiro e corrupção de políticos do governo
do falecido governador Eduardo Campos, do PSB, em conluio com
empresários. Nas escutas feitas pela PF coma autorização judicial,
algumas das negociações do grupo são identificadas como “negócios do
petróleo” – uma referência à construção da refinaria de Ipojuca, próxima
a Jaboatão dos Guararapes.
Junto com vários outros colegas da
Câmara, todos agora denunciados na ação penal, Geraldo Cisneiros começou
a atuar em fraudes em licitações em outros municípios do estado. Em
princípio, na compra de merenda e uniformes escolares de cidades
administradas pelo PSB, partido para o qual o ex-tucano Bruno Rodrigues
migrou.
A dobradinha passou a responder pelos
dois partidos no esquema: um cuidava dos interesses do PSDB, o outro, do
PSB. Foi quando a PF identificou “uma verdadeira quadrilha”, no qual o
doleiro e o tesoureiro de Eduardo Campos direcionavam licitações
milionárias nos órgãos do estado para favorecer o esquema de corrupção.
A partir da investigação sobre jogo do
bicho explorado pelo doleiro Emereciano, a polícia acabou por
identificar 29 núcleos criminosos, cada qual descrito no relatório final
do inquérito enviado à Justiça. Foram listados os integrantes da
quadrilha e feitas as tipificações dos crimes por eles cometidos.
Sangria – A Petrobras
aparece como um dos alvos do esquema de corrupção descoberto pela PF. De
acordo com o inquérito, o Consórcio Terraplanagem, responsável por
obras no complexo do Porto de Suape para construção da refinaria Abreu e
Silva e o estaleiro Atlântico Sul, desviou, junto com a prefeitura de
Ipojuca e várias empresas que participavam das obras, R$ 5,7 milhões da
estatal em areia de aterro e da dragagem do porto.
Tudo com autorização de autoridades do
estado, entre os anos de 2007 e 2008 – período em que Campos era
governador de Pernambuco. Desse total, R$ 572,2 mil chegaram a ser
faturados pela Petrobras ao consórcio, mas a PF informa no inquérito
que, mesmo com a formalização da operação de venda da areia, o valor não
foi pago.
O inquérito revela que auditoria
especial do Tribunal de Contas da União (TCU) identificou os
responsáveis pelo desvio: o então diretor-superintendente do complexo
portuário de Suape, Fernando Bezerra, ex-ministro da Integração Nacional
e senador eleito pelo PSB, e Claudino Pereira, ex-diretor do porto.
O documento esclarece que os dois
autorizaram a doação de 995,5 mil metros cúbicos de areia, embora
contratualmente as receitas pertencessem à Petrobras. Do total, 760,4
mil metros foram extraídos da dragagem do porto. Contratualmente, as
receitas pertenciam à estatal.
O inquérito policial federal foi aberto,
inicialmente, em 2007, ano seguinte à posse de Eduardo Campos como
governador do estado. Após seis anos de investigações sigilosas,
resultou em distintas ações penais. Isso porque os delitos ali
encontrados foram tipificados, ora como crimes comuns, ora como
federais.
O inquérito tem cerca de 40 volumes de
documentos, com milhares de páginas, entre relatórios, documentos com a
quebra de sigilo de muitos investigados, centenas de cópias de cheques e
extratos de contas-corrente e dezenas de CDs com a gravação de horas de
grampos digitalizados e transcritos.
Entre eles, diálogos entre investigados e
o ex-governador do PSB, no qual Eduardo Campos cobra do presidente da
Ceasa, seu ex-tesoureiro de campanha, Romero Pontual, a realização de
uma licitação na Secretaria da Educação.
A PF estranhou o fato de Pontual, ainda
hoje responsável no governo pela área de abastecimento de produtos
agrícolas, ter sido escalado por Campos para tratar de assunto
totalmente alheio aos interesses da Ceasa.
Isso levou a PF a identificar Pontual
como um dos líderes do esquema e fechar o organograma da corrupção. Ele e
Bruno Rodrigues eram responsáveis pela identificação de oportunidades e
pelo tráfico de influência com outras autoridades estaduais. Jordão
Emereciano providenciava a lavagem do dinheiro e o presidente da Ceasa
operava as fraudes.
O inquérito 172/2010 da PF, que trata do
crime de fraude contra o sistema financeiro, foi separado do original
(533/2007) e resultou em ação que tramita na 13ª Vara da Justiça Federal
em Pernambuco contra os empresários e doleiro Jordão Emereciano,
representante da corretora Didier & Levy, e Otto Schmidt Neto,
ex-gerente de uma agência da Caixa Econômica Federal.
Todos eles são acusados pela PF por
gestão fraudulenta de instituição financeira, lavagem ou ocultação de
bens, direitos e valores, e uso de documento falso.
Blindagem – Em 2013,
uma decisão do Tribunal Federal da 5ª Região (TRF5) ordenou que parte
das investigações da PF tivesse tratamento de ação penal comum com foro
local. Mas, apesar da gravidade das denúncias, o escândalo foi
solenemente ignorado pela imprensa pernambucana. O silêncio em torno do
assunto e a complexidade para criminalizar a ação dos envolvidos poderá,
inclusive, livrar os acusados graças à prescrição das penas.
Mesmo porque a PF identificou o braço do
esquema responsável pela proteção e blindagem das irregularidades nas
licitações fraudulentas: a Procuradoria Geral de Justiça do Estado
(PGE), cujo papel é exatamente o de fiscalizar e zelar pelas boas
práticas administrativas e pelo correto emprego do dinheiro público.
O inquérito revela que, nesse ponto,
entrou em campo o “homem forte do PSB”, Romero Pontual, presidente da
Ceasa, com forte influência sobre as demais autoridades. “Ele era uma
espécie de PC Farias do esquema”, afirma Noelia Britto, procuradora da
prefeitura de Recife.
No relatório, a PF constata a influência
de Pontual sobre a PGE. Fala das ligações do presidente da Ceasa com
Tadeu Alencar, procurador-geral do estado, acusado de direcionar o
processo para que uma outra procuradora, Taciana Xavier, opinasse
favoravelmente à dispensa de licitação.
A procuradora não tem ligação direta com
o caso. Noelia, no entanto, organizou e distribuiu cópias do processo à
imprensa e emissoras locais, em vão. Mesmo com tudo documentado, teve o
esforço era ignorado pelas redações pernambucanas. A única visibilidade
conseguida foi por meio de um blog na internet. Acabou, segundo ela,
ameaçada de morte.
A reportagem entrou em contato com a
assessoria de Romero Pontual, presidente da Ceasa, um dos denunciados em
três dos 29 inquéritos do processo. Pontual é considerado um dos
líderes do esquema, mas não quis se pronunciar. O assessor de imprensa
da Ceasa, José Machado, tentou desqualificar a notícia sobre o
escândalo. Segundo ele, trata-se de “espalhafato”, sem credibilidade por
ser pauta da Agência PT de Notícias. Em seguida, bateu o telefone.
Por Márcio Morais, da Agência PT de Notícias
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